“Num ambiente democrático, manifestações públicas são pacíficas, por sua vez, a liberdade de expressão não comporta violências e ameaças. O exercício de nossa cidadania pressupõe respeito à integridade das instituições democráticas e de seus membros”, declarou Fux.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem convocado os protestos para 7 de setembro. Em discurso durante evento em Uberlândia (MG), em 31 de agosto, ele disse que a data seria uma “nova independência” para o Brasil.
Membros do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) estiveram na Avenida Paulista no dia 30 de agosto para fazer o reconhecimento do local, tendo em vista que Bolsonaro deseja participar da manifestação. O caminhão em que o presidente irá falar não poderá se movimentar e ainda foi checado o distanciamento para que seja possível instalar detectores de metais.
Durante evento com medalhistas olímpicos de Tóquio-2020, no Rio de Janeiro, na quarta-feira (1º), Bolsonaro afirmou que “com flores não se ganha a guerra. Se você fala de armamento. Se você quer paz, se prepare para a guerra”.
Fux, por sua vez, rebateu a declaração com uma frase de Martin Luther King Jr: “a paz jamais será mantida pela força; ela só pode ser obtida por meio do entendimento mútuo”.
A atuação do STF na democracia foi destacada por Fux, afirmando que a Suprema Corte “tem sido um ferrenho defensor das liberdades públicas”, e citou como exemplo “as decisões judiciais que garantiram a realização de diversas manifestações públicas em momentos históricos do país” e “a nulidade de decisões da Justiça que impediam a livre manifestação político-eleitoral em universidades públicas, entre outros tantos exemplos da farta jurisprudência constitucional”.
Por fim, concluiu o pronunciamento alegando que “o bem do país se garante com o estrito cumprimento da Constituição”. E que o STF “segue atento e vigilante” para a manutenção da plenitude democrática durante as manifestações no Dia da Independência.
Confira o discurso de Fux na íntegra:
Aproxima-se a data de 7 de setembro e, na qualidade de Presidente da Corte Suprema, impõe-se uma palavra de respeito à democracia nacional e das manifestações programadas para o feriado de celebração da independência do Brasil.
A formação histórica do Brasil, como povo e como nação, consiste em narrativa complexa, permeada por esforço, suor e lutas. A própria declaração de independência, em 7 de setembro de 1822, não foi apenas um grito solitário às margens do Ipiranga, mas resultado da sucessão de atos corajosos empreendidos por inúmeros brasileiros, muitos dos quais doaram as suas vidas em prol da construção do país.
Quase dois séculos depois, após um percurso político desafiador que nos legou maturidade institucional, hoje somos, sem dúvidas, uma das maiores democracias constitucionais do mundo. Ostentamos um catálogo monumental de direitos fundamentais civis, políticos e sociais, além de termos instituições fortes, republicanas e em pleno funcionamento. Acima de tudo, somos destaque internacional por nosso pluralismo político, cultural e religioso, que caracteriza o nosso povo.
Não nos olvidemos, porém, que nenhum povo constrói sua identidade sem dissenso e nenhuma nação alcança a prosperidade sem debates sobre o desempenho dos seus governos e de suas instituições. A crítica construtiva provoca reflexões, descortina novos pontos de vista e convida ao aprimoramento institucional. A crítica destrutiva, por sua vez, abala indevidamente a confiança do povo nas instituições do país.
É por isso que a postura ativa e ordeira da população em prol de pautas sociais, políticas e ideológicas revela-se manifestação louvável, porquanto sinônimo de saúde democrática e de engajamento cívico. Por outro lado, como patrimônio coletivo, a nossa democracia desperta o senso de responsabilidade de todos os brasileiros, que devem reafirmá-la em todos os momentos da vida. Afinal, a nossa democracia não nos foi herdada nem outorgada, mas corajosamente conquistada.
Somos testemunhas oculares de que o caminho para a estabilidade da democracia brasileira não foi fácil nem imediato. Por essa razão, é voz corrente nas ruas que, na quadra atual, o povo brasileiro jamais aceitaria retrocessos! Há mais de 30 anos, nossos cidadãos manifestaram o seu desejo pela democracia. Esse desejo permanece vivo e perpassa o compromisso nacional em prol de debates públicos permeados pelos ideais republicanos.
O Supremo Tribunal Federal tem sido um ferrenho defensor das liberdades públicas, como demonstram, exemplificadamente, as decisões judiciais que garantiram a realização de diversas manifestações públicas em momentos históricos do país; bem como declararam a nulidade de decisões da Justiça que impediam a livre manifestação político-eleitoral em universidades públicas, entre outros tantos exemplos da farta jurisprudência constitucional.
Sabemos que as liberdades públicas não são benesses concedidas pelo Estado, mas vitórias históricas dos cidadãos brasileiros, dos quais se espera cuidado para com os próprios direitos fundamentais. Por isso mesmo, esta Suprema Corte – guardiã maior da Constituição e árbitra da Federação – confia que os cidadãos agirão em suas manifestações com senso de responsabilidade cívica e respeito institucional, independentemente da posição político-ideológica que ostentam.
Num ambiente democrático, manifestações públicas são pacíficas; por sua vez, a liberdade de expressão não comporta violências e ameaças. O exercício de nossa cidadania pressupõe respeito à integridade das instituições democráticas e de seus membros, conforme a lição legada por Martin Luther King Jr: “a paz jamais será mantida pela força; ela só pode ser obtida por meio do entendimento mútuo”. A despeito de todas as nossas diferenças de opinião, de ideologia política e de projetos nacionais, NÓS, cidadãos brasileiros, somos uníssonos num ponto fundamental: o amor pelo Brasil e o orgulho pelo que construímos como nação.
Seja nos momentos de tormenta, seja nos momentos de calmaria, o bem do país se garante com o estrito cumprimento da Constituição. A esta missão jamais renunciaremos, como juízes constitucionais. O Supremo Tribunal Federal – instituição centenária e patrimônio do povo brasileiro – segue atento e vigilante, neste 7 de setembro, pela manutenção da plenitude democrática.